NUTRIÇÃO: Educação para a saúde e prevenção contra doenças
Os
lamentáveis episódios protagonizados na cidade de Araguari-MG trazem à luz,
além dos indícios de interferência indevida na atividade de agentes fiscais
sanitários, uma questão de capital importância para a saúde coletiva e
negligenciada desde a criação do Sistema Único de Saúde. Trata-se da importância da presença de profissionais
nutricionistas nos quadros das secretarias municipais de saúde,
em número suficiente para desenvolver todas as atividades relacionadas aos
cuidados nutricionais destinados à população.
A Lei
Orgânica da Saúde (Lei 8080, de 19.09.1990), que “Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da
saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras
providências” elenca, dentre as atribuições fundamentais do SUS, as ações relacionadas
ao cuidado nutricional:
Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação
do Sistema Único de Saúde (SUS):
I - a execução de ações:
a) de vigilância sanitária;
b) de vigilância epidemiológica;
c) de saúde do trabalhador; e
d) de assistência terapêutica integral, inclusive
farmacêutica;
II -...;
III - ...;
IV - a vigilância nutricional e a orientação alimentar;
...
Apesar da imposição
legal, fundamentada na criteriosa análise da amplitude necessária para prover a
todos os cidadãos brasileiros a atenção integral à saúde, as obrigações
relativas à vigilância nutricional e orientação alimentar não são cumpridas de
forma minimamente satisfatória.
Historicamente, por uma herança cultural equivocada e curta, disseminou-se
pelo país a lógica de que saúde pública se resume a cuidados terapêuticos e
propedêuticos, centrando o foco apenas e principalmente nos cuidados médicos;
que têm, sem dúvida, fundamental importância, mas não são suficientes para prover
ao cidadão as condições de plena saúde.
Senão, vejamos o que reza o artigo 3º da referida lei:
Art. 3º A saúde tem como fatores determinantes e
condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a
educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os
níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do
País.
Parágrafo único. Dizem respeito também à saúde as
ações que, por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às
pessoas e à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.
De forma geral, é preciso rever com urgência a questão, incluindo nos
quadros das secretarias municipais de Saúde, Ação Social e Educação,
principalmente, profissionais nutricionistas em número suficiente, para levar a
cabo a missão do SUS e garantir o direito do cidadão de acesso à alimentação
segura.
O argumento, sempre
utilizado, de que não há recursos financeiros para ampliação dos gastos com
pessoal cai por terra com dois contra argumentos simples:
1) Havendo redução de cargos comissionados, alguns deles totalmente
dispensáveis, é possível reorganizar a questão do custo da folha;
2)
As ações preventivas e educativas
promovidas pelo profissional de nutrição possibilitam, em curto espaço de
tempo, a redução de gastos com doenças e internações hospitalares evitáveis,
melhorando a qualidade de vida do cidadão.
Por
outro lado, contando com quadro adequado de profissionais nutricionistas, será
possível, por exemplo, dotar o serviço de Vigilância Sanitária de plenas
condições de orientação e fiscalização, no tocante aos processos de
manipulação, produção e comercialização de alimentos. Foi justamente esse setor
que, por descumprimento de normas básicas, sofreu a recente fiscalização e vem
passando pelo transtorno de interdições.
Anos
atrás, como gestor do SUS vi frustrada minha tentativa de inclusão de um maior
número de nutricionistas no quadro da secretaria de saúde. Jamais consegui qualquer
tipo de apoio à demanda. Contávamos, na época, com apenas uma profissional que
embora de dedicasse não conseguia, por absoluta falta de condições, cumprir
todo o rol de ações necessárias para uma população de 110 mil habitantes.
Quem sabe agora, com a
enorme exposição na mídia das condições inseguras de produção de alimentos, e
os consequentes riscos aos quais fica exposta toda a população, os governos
municipais de todo o país decidam, enfim, cumprir a lei e incluir nas
secretarias municipais de saúde o número adequado de nutricionistas.
Compete aos profissionais
nutricionistas e órgãos representativos da classe exercer a cobrança, com base
nas diretrizes do SUS. Já a sociedade, deve sair do estado de inércia e passar
a exigir dos governos, de forma geral, a devida atenção com o Sistema Único de
Saúde.
Quanto aos agentes
políticos, ao invés de participarem de passeatas “contra a fiscalização” que
arregacem as mangas e façam cumprir a Lei Orgânica da Saúde, no tocante às
questões nutricionais, dentre outras.
Edilvo Mota
Especialista
em gestão de saúde
Ex-secretário
municipal de saúde em Araguari-MG
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