(Artigo publicado em minha coluna semanal "Painel", de 26/05/2010, no jornal Diário de Araguari)
Tema recorrente no estudo sobre políticas públicas, a participação comunitária ainda representa um tabu, cercado de descrença e omissão por todos os lados. Paradoxalmente, na democracia incipiente vivenciada pelo país, a mesma população que clama por decência e transparência na administração pública, que brada contra a corrupção e a quase inércia na execução da necessária agenda social, é a mesma que prefere a omissão ou o descaso, quando ocorre o chamamento à intervenção.
O discurso generalizado e quase unânime é de que as coisas precisam mudar, que é preciso moralizar o país, que a corrupção no meio político é uma vergonha, que o dinheiro público é sagrado, e tal e coisa. Mas impressiona, sobremaneira, a subserviência aos que estão instalados no poder, desde sempre.
A cultura de idolatrar políticos em exercício de mandato é o maior obstáculo ao controle social, principal ferramenta para a consolidação do estado democrático de direito e a plena fiscalização das atividades de interesse comunitário. E nenhuma democracia pode ser compreendida como tal se não houver a efetiva participação da sociedade na gestão da coisa pública.
Especificamente no caso da saúde pública, a instituição dos conselhos municipais de saúde foi um importante avanço na garantia do controle social. Lamentavelmente, o interesse pela participação dos diversos setores comunitários é inversamente proporcional ao permanente (e justo) reclame por melhorias na qualidade e quantidade do atendimento.
Em 2002, exercendo a função de diretor da Associação Comercial e Industrial de Araguari, fui voluntário para participar do conselho de saúde, levando às deliberações a representatividade do segmento empresarial, sem deixar de lado minhas convicções pessoais. E, naquela oportunidade, conseguimos importante avanço, ao inovar e promover, provavelmente pela primeira vez, a eleição de um representante dos usuários do SUS como presidente do colegiado, contrariando a lógica até então vigente que conduzia, automaticamente, o secretário (ou secretária) de saúde à presidência.
Sem perder a coerência, ao assumir a gestão municipal do SUS, no início de 2005, respeitei minha convicção pessoal e me recusei a concorrer à presidência do conselho municipal de saúde. Pela óbvia razão de que o secretário de saúde não deve (legalmente, até pode) presidir um colegiado que tem como uma de suas atribuições justamente fiscalizar as ações da secretaria.
Durante os 39 meses em que permaneci à frente da pasta da saúde, mantive o absoluto respeito à autonomia do conselho, inobstante a polêmica que sempre gira ao redor de uma instituição tão pluralista em sua formação; seja na sua composição, nas deliberações ou mesmo nas conferências de saúde. A lamentar, de fato, apenas a completa alienação do Poder Legislativo, que jamais se dignou a enviar sequer um de seus membros a qualquer das reuniões; nem mesmo os componentes da Comissão de Saúde. Um dia, esse estado de letargia há de mudar...
Boa semana a todos.
edilvomota@hotmail.com
http://saudenatela.blogspot.com/
4 comentários:
Eu acredito em mudanças também, mas a bem a longo prazo. Precisa morrer muita gente ruim deste sistema falho.
Acho que essa apatia toda está relacionada com o desconhecimento do sistema de saúde por parte da população. Se não conheço, não dou importância. Se não é importante, por que devo participar?
E nesse caso como criticar a população quando sabemos que mais da metade dos profissionais da área da saúde, que teoricamente teriam obrigação de conhecer, também desconhecem o sistema de saúde em que atuam?
Precisamos urgentemente de educação de qualidade...
Correto o comentário de "pilula contra".
Quando desempenhei a função de gestor municipal do SUS, me esforcei por todos os meios (imprensa, reuniões do conselho, reuniões com associações de bairros) para divulgar os princípios do SUS e estimular a participação da comunidade. E ainda era criticado por membros do próprio governo, por minha "ingenuidade".
Em meu último encontro com o ministro da saúde, comentei sobre a necessidade de incrementar uma ação massiva de informação sobre os direitos do cidadão na saúde.
Sempre haverá tempo...
Entretanto, a população também tem sua parcela de culpa, na medida em que, às vezes mesmo conhecendo seus direitos, dá de ombros e se omite. Temos muito trabalho pela frente...
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